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Desvendando o mistério: por que a carne no Brasil está cada dia mais barata em 2023?

A indústria da carne no Brasil, vital para a economia, enfrenta complexos desafios de preços. A queda recente nos preços da carne bovina está atrelada a fatores como sazonalidade, flutuações cambiais e seus impactos econômicos.
Fatores que impulsionam a queda de preços
Conforme o pecuarista Ricardo Kormives, de 40 anos, a abundância de oferta é uma das principais razões que contribuem para a recente queda nos preços das carnes no mercado brasileiro.
“Atualmente, estamos vivenciando um período em que a oferta de gado está elevada devido ao início do plantio de lavouras de milho. Isso resulta em uma maior disponibilidade de áreas antes destinadas à criação de gado”, explica o pecuarista.
Outro elemento-chave, segundo Kormives, é o preço do terneiro, que está em níveis historicamente baixos, levando à venda de fêmeas e à ampliação da oferta de gado no mercado interno.
Consequentemente, os frigoríficos detêm considerável influência na definição dos preços, dado o volume significativo de oferta.
“Os frigoríficos têm a prerrogativa de ditar os preços, especialmente quando as transações não estão atreladas a bolsas de venda futura. O mercado responde à lista de preços semanal divulgada por eles”, explica.
Influência dos insumos na produção e preços
Sobre o impacto das variações nos preços dos insumos, como ração e medicamentos para o gado, na sua produção e nos preços de venda da carne, Kormives destaca que, embora esses fatores influenciem os custos de produção, os pecuaristas acabam vendendo seus produtos de acordo com as condições do mercado.
“Nós, produtores, vendemos pelos preços que o mercado aceita. Tentamos adotar estratégias para reduzir custos, mas a decisão final não está em nossas mãos”.
No entanto, o pecuarista expressa otimismo quanto a uma possível melhora nos preços, graças ao aumento do consumo interno previsto para o final do ano.
Sazonalidade e flutuações nos preços
A sazonalidade é outro elemento intrínseco à produção de carne e aos preços.
De acordo com Kormives, existem épocas do ano em que a oferta de gado é mais elevada, como durante a entressafra de inverno e no verão, quando os pecuaristas retiram os animais para o abate após engordá-los durante o inverno.
O pecuarista observa que essa entressafra, que coincide com o período de festividades no final do ano, tende a resultar em uma queda nos preços, seguida por um aumento gradual devido ao aumento do consumo nessa época.
Impacto das exportações nas flutuações de preços
Kormives também explica que uma diminuição nas exportações resulta em um maior volume de carne disponível no mercado interno, o que, por sua vez, reduz os preços.
“É importante lembrar que o elo mais vulnerável dessa cadeia é o produtor, enquanto o frigorífico e o mercado têm margens maiores”, destaca.
Adaptação dos pecuaristas à queda de preços
Quando perguntado sobre como os pecuaristas estão se adaptando à queda de preços, Kormives ressalta que cada produtor adota estratégias específicas de acordo com as características de sua propriedade.
No entanto, a maioria dos produtores procura reduzir gastos e encontrar soluções mais econômicas, embora essas alternativas nem sempre tenham o mesmo resultado positivo.
“A pecuária é cíclica e, no futuro, espera-se uma recuperação dos preços à medida que o ciclo [de produção] se desenvolve”.
Impacto econômico da queda nos preços
Para compreender as implicações econômicas, o ND+ conversou com o professor Nilson Broring, do CAV (Centro de Ciências Agroveterinárias) da Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina) em Lages.
O professor Broring ressalta que a queda dos preços da carne bovina no Brasil deve ser analisada em duas vertentes: a carne comercializada no varejo ao consumidor final e os preços praticados para os bovinos de corte comercializados vivos ou através da carcaça.
Broring observa que, em regra, a queda nos preços praticados pelas redes de frigoríficos tem pouca relevância para os preços praticados pelo varejo.
“Isso acontece porque o varejo adiciona seus próprios custos à equação, o que resulta em uma redução menor dos preços para o consumidor final”, diz.
Já para os produtores rurais o impacto é maior, levando-os a reter os animais por mais tempo em pastagens, o que diminui a oferta no mercado.
“Isso, por sua vez, força os frigoríficos a buscar fornecedores distantes, aumentando os custos logísticos”.
Essa pressão sobre os produtores também os leva a reduzir investimentos em tecnologias e melhorias nutricionais, o que prejudica a eficiência da cadeia de produção da carne.
A falta de políticas de controle das relações de custo-benefício na cadeia da carne reduz as arrecadações pelo Estado e inibe investimentos no setor como um todo.
Gerenciamento da rentabilidade
Quanto ao gerenciamento da rentabilidade das fazendas e ranchos, Broring explica que a pecuária de corte no Brasil é caracterizada por ser de ciclo longo, dependendo de sistemas de produção a pasto.
As oscilações sazonais na quantidade e qualidade do material forrageiro afetam os ganhos e perdas de peso dos animais. Essas mudanças nutricionais impactam o tempo necessário para entregar os animais ao mercado.
Os preços também influenciam na demanda por carne. Com preços mais baixos, os produtores reduzem o uso de insumos e tecnologias, o que retarda a entrega dos animais ao mercado e diminui a capacidade de captação financeira para investimentos.
“A menor rotatividade do sistema produtivo, influenciada pelos baixos preços da carne, reduz a capacidade de investimento do setor”, afirma.
Política governamental e regulamentações
O professor aponta ainda que manifestações políticas desfavoráveis ao agronegócio e a insegurança jurídica no campo prejudicam o setor.
Broring destaca a necessidade de discussões mais aprofundadas entre os elos da cadeia de produção da carne e a ausência de projetos de médio e longo prazo em substituição a ações eleitoreiras.
Além disso, salienta a importância da inclusão do conhecimento no campo, por meio de agentes extensionistas, associados a estudos de impacto econômico em âmbito local, estadual e federal.
Análise econômica e perspectivas
Segundo o analista de Socioeconomia e Desenvolvimento Rural, Alexandre Ghiel, da Epagri/Cepa, um fator-chave para a queda nos preços da carne bovina é a alta oferta de animais prontos para o abate em todo o Brasil.
Dados do IBGE revelaram um aumento de 8% no abate de bovinos no primeiro semestre, com 15,59 milhões de cabeças abatidas. Essa oferta elevada exerce pressão para a redução dos preços.
Outro fator mencionado por Ghiel é a variação negativa nos preços das carnes concorrentes, como frango e suína, nos últimos meses. Essa competição acirrada pelo consumidor contribui para a queda nos preços da carne bovina.
Além disso, a redução dos custos de produção animal, especialmente devido à queda nos preços do milho, também influencia a diminuição dos preços de atacado e varejo.
Impacto das flutuações cambiais
Ghiel explica que as flutuações cambiais afetam a competitividade das exportações de carne brasileira.
“Quando o real se valoriza em relação ao dólar, as empresas brasileiras exportadoras enfrentam dificuldades em oferecer preços competitivos no mercado internacional”.
Segundo Ghiel, isso pode levar a aumentos nos preços em dólares ou a reduções nas margens de lucro das empresas.
“Por outro lado, quando o dólar se valoriza, as exportações tornam-se mais vantajosas e competitivas”.
No entanto, isso pode elevar os custos de importação de matérias-primas, o que pode impactar as margens de lucro das empresas que dependem de insumos importados.
Impacto na inflação e estabilidade econômica
Ghiel observa que as carnes, incluindo a bovina, são um componente importante do índice de inflação.
“A queda nos preços das carnes tende a contribuir para a desaceleração da inflação”.
Além disso, essa redução pode afetar os preços das outras proteínas de origem animal, à medida que os consumidores buscam opções mais acessíveis.
A ampliação da demanda por carne em nível mundial pode impulsionar as exportações de carne brasileira, em parte devido aos surtos de Peste Suína Africana (PSA) na China, que afetaram significativamente a produção de carne suína naquele país e aumentaram a demanda por outras proteínas, como a carne bovina.
No entanto, Ghiel ressalta que mudanças nos hábitos de consumo em outros países podem afetar os preços internos da carne no Brasil, dependendo do ritmo de crescimento das exportações e das condições da oferta interna.
Políticas governamentais de apoio
Por fim, Ghiel também enfatiza a importância de políticas governamentais para apoiar o setor.
Isso inclui o desenvolvimento e a difusão de tecnologias adequadas para aumentar a produtividade, a disponibilização de crédito rural e a assistência técnica e extensão rural para garantir que os produtores tenham acesso ao conhecimento e às tecnologias necessárias.