Para Bolsonaro, as imagens aterradoras dos yanomamis famintos não passam de “mi-mi-mi”

Foragido em Miami, ele gravou um vídeo dizendo que as imagens desumanas, que revelam como ele tratava os índios, são uma “farsa da esquerda”
Jair Bolsonaro afirmou que a tragédia vivida pelos povos yanomamis na região norte do país, com imagens de crianças e adultos famintos, em pele e osso, que chocaram o mundo, é uma “farsa da esquerda”.
Na live, feita em Miami e divulgada pelo seu canal no Telegram, Bolsonaro não explica o que significam as imagens aterradoras da fome e da miséria entre os yanomamis. Ele tentou tapar o sol com a peneira com essa conversa de farsa da esquerda. São fatos. Só faltou dizer que os índios estavam de mi-mi-mi.
Os dados foram revelados pelo portal de jornalismo baseado na Amazônia Sumaúma. A reportagem apontou que, durante o governo de Jair Bolsonaro, o número de mortes de crianças com menos de cinco anos por causas evitáveis aumentou 29% no território Yanomami.

O abandono era explícito. O governo Bolsonaro desmantelou os órgãos de apoio aos índios e de fiscalização das invasões de terras demarcadas. Ele estimulou e liberou o garimpo ilegal em terras indígenas. O ódio aos povos originários era verbalizado por Bolsonaro em quase todo os seus discursos.
“Nem um centímetro a mais de terra indígena será demarcado”, dizia ele.
O Planalto era cúmplice do garimpo ilegal, dos contrabandistas de madeira, dos grileiros e desmatadores. Perseguia servidores que reprimiam os crimes ambientais. Os criminosos e bandoleiros eram tão ligados a Bolsonaro, que fizeram até o ministro do Meio Ambiente de seu governo.
Assim que foram divulgadas as primeiras imagens da miséria e da desnutrição agudas que atingiram adultos e crianças Yanomamis, o presidente Lula se deslocou imediatamente para Roraima.
Em coletiva de imprensa em Roraima, ele culpou a gestão de Jair Bolsonaro pela tragédia. “É desumano o que eu vi aqui. Sinceramente, se o presidente que deixou a Presidência esses dias, em vez de fazer tanta motociata, tivesse vergonha e viesse aqui uma vez, quem sabe esse povo não estivesse tão abandonado como está”, disse Lula.

“Mais que uma crise humanitária, o que vi em Roraima foi um genocídio. Um crime premeditado contra os yanomami, cometido por um governo insensível ao sofrimento do povo brasileiro”, acrescentou Lula.
De acordo com a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, 570 crianças morreram de fome nos últimos 4 anos. Outras 99 crianças dos povos yanomamis que residem em Roraima morreram em decorrência do avanço do garimpo ilegal na região. Os dados são de 2022 e as vítimas foram crianças entre um e 4 anos. Além disso, de acordo com Guajajara, 700 pessoas estão em atendimento.
Os números apresentados por Bolsonaro no vídeo não explicam as trágicas imagens da fome que chocaram a mundo. O abandono dessas pessoas é evidente. Índios desassistidos, doentes e morrendo à míngua. Mas ele insistiu: “De 2020 a 2022, foram realizadas 20 ações de saúde que levaram atenção especializada para dentro dos territórios indígenas, especialmente em locais remotos e com acesso limitado”, disse Bolsonaro.
Só que todos sabem que ele se lixava para os índios e que, se enviou remédios aos yanomamis, deve ter sido cloroquina durante a pandemia de covid.
Logo depois do vídeo de Bolsonaro, suas milícias digitais espalharam pelas redes a narrativa mentirosa de que os indígenas mortos ou desnutridos que aparecem fariam parte das tribos da etnia que ficam na Venezuela. Só que todos os fatos denunciados nos últimos dias dizem respeito às comunidades que ficam no Brasil. O grupo indígena também está presente em território venezuelano, mas os desnutridos são brasileiros.
A situação de calamidade não foi denunciada apenas pelos indígenas, pesquisadores e órgãos de saúde. Nos últimos anos, o Ministério Público Federal vem apontando a necessidade de uma intervenção na região. Nos últimos dois anos, recomendações do MPF de Roraima indicavam diversas medidas que o governo federal precisava tomar para reestruturar a assistência básica de saúde na TIY, e há dois meses os procuradores já pediam a criação de uma sala de situação específica, o que foi feito agora.