Hugo Motta e suas três funcionárias fantasmas

Presidente da Câmara mantém em seu gabinete servidoras com atividades incompatíveis com a função pública; duas demissões foram ordenadas após denúncias
O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), mantém em seu gabinete três funcionárias fantasmas, com atividades incompatíveis com o exercício do cargo público. Lotadas como secretárias parlamentares, as servidoras — uma fisioterapeuta, uma estudante de medicina e uma assistente social vinculada à prefeitura de João Pessoa (PB) — ocupam cargos que exigem dedicação exclusiva de 40 horas semanais e proíbem o acúmulo com outras funções públicas.
As irregularidades foram reveladas nesta terça-feira (15) por reportagens do portal Metrópoles e da Folha de S.Paulo, que acompanharam a rotina das servidoras, acessaram documentos oficiais e cruzaram informações com dados de instituições públicas.
Rotinas incompatíveis com o cargo
A fisioterapeuta Gabriela Pagidis, de 30 anos, atua em duas clínicas no Distrito Federal: às segundas e quartas-feiras em tempo integral no Instituto Costa Saúde, na Asa Norte, e às terças e quintas à tarde no Centro Clínico Bandeirantes.
A informação foi confirmada pelas próprias clínicas. Mesmo com essa agenda cheia, ela está lotada desde 2017 no gabinete de Hugo Motta como secretária parlamentar. Neste período, já recebeu mais de R$ 800 mil da Câmara dos Deputados.
A reportagem do Metrópoles também verificou que Gabriela frequenta academia em horários que deveria estar trabalhando na Câmara e compartilha sua rotina nas redes sociais. Em um processo judicial anterior, ela se apresentou como desempregada.
A estudante de medicina Louise Lacerda, filha de um ex-vereador aliado de Motta, está matriculada em curso integral na Faculdade Nova Esperança, em João Pessoa. Mesmo assim, figura na folha de pagamento da Câmara desde 2018.
Já Monique Magno, também de João Pessoa, é funcionária da prefeitura municipal como assistente social desde 2021, com jornada de 30 horas semanais. A Câmara não permite o acúmulo com outro cargo público.
R$ 112 mil em 2025
Segundo apuração da Folha, as três funcionárias já receberam juntas R$ 112 mil em 2025, somando salários, gratificações e auxílios pagos com recursos públicos. Após ser procurado pela imprensa, Motta determinou o desligamento de Louise e Monique, mas as exonerações ainda não foram publicadas no boletim da Câmara.
A assessoria de Motta afirmou ao jornal que “preza pelo cumprimento rigoroso das obrigações dos funcionários”, inclusive os que atuam remotamente, e se negou a apresentar qualquer registro de frequência ou documentação que comprove a atuação das servidoras.
Ex-sogra do pai também recebe salário público
Outro nome ligado ao gabinete é o de Maria do Carmo Brito, ex-sogra do pai de Hugo Motta, o prefeito de Patos (PB), Nabor Wanderley. Ela está nomeada desde 2020 como assessora parlamentar e recebe R$ 2.900 de salário, além de R$ 1.800 em auxílios. Em 2021, contudo, declarou à Justiça estar desempregada para justificar um pedido de usucapião de imóvel. A informação surpreendeu até políticos da cidade natal de Motta.
Críticas à fiscalização e uso de cargos políticos
O escândalo reforça críticas antigas ao uso de cargos comissionados para fins pessoais e políticos no Congresso Nacional. A ausência de ponto biométrico e a falta de controle sobre a jornada dos secretários parlamentares alimentam um sistema propício ao empreguismo e ao desvio de finalidade dos recursos públicos.
O caso também levanta questionamentos sobre a fiscalização interna da Câmara e o papel da Presidência da Casa — ocupada justamente por Motta — na garantia de transparência administrativa.