Terras raras: o que os EUA querem e por que o Brasil virou alvo da disputa por minérios críticos

Especialista defende política estratégica para agregar valor, garantir soberania e impulsionar desenvolvimento tecnológico nacional
O Brasil é a terceira maior reserva do mundo no que diz respeito a terras raras (ETRs) — era o que revelavam os dados recentes. Buscando reduzir a dependência da China (liderança em ETRs), o presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, voltou seus olhos para a Ucrânia, fornecendo proteção em troca dos minérios críticos, e para o Brasil, motivado por alianças políticas com a família Bolsonaro, alvo de ações no Supremo Tribunal Federal (STF). Esses são pequenos indícios, apenas, por trás dos interesses estadunidenses no Brasil.
O professor de Direito Internacional, Paulo Henrique Gonçalves Portela, considera que, apesar dos dados globais de minérios críticos, o Brasil na verdade já desponta como o dono da segunda maior reserva de terras raras do planeta, atrás apenas da China. No entanto, ainda depende da potência asiática para o processamento e beneficiamento dos minérios — etapa que concentra maior valor agregado e importância estratégica.
Essenciais para tecnologias de ponta como smartphones, turbinas eólicas, motores de veículos elétricos, chips, equipamentos médicos e sistemas de defesa, as terras raras são o “petróleo” da transição energética e digital. Isso faz com que o controle sobre suas cadeias de produção seja disputado entre grandes potências como EUA, China e União Europeia. “Os EUA, por exemplo, são altamente dependentes da China nesse setor e têm demonstrado interesse crescente nas reservas brasileiras, justamente para reduzir essa dependência”, explica Portela.
Portanto, as terras raras são uma oportunidade do Brasil se consolidar de vez como protagonista da transição energética, além de proteger a soberania de exploração estrangerida ou entrega após coação no mercado internacional, como é o caso do que os EUA têm tentado fazer.
“As terras raras podem ser um passaporte para o Brasil se consolidar como um ator relevante na transição energética e tecnológica global”, pontua Portela. “O Brasil não pode se dar ao luxo de repetir o ciclo colonial de exportar riqueza bruta e importar progresso. O controle da cadeia das terras raras é um caminho possível e necessário para o desenvolvimento soberano”, conclui.
Agora, ocorre uma corrida contra o tempo e iniciam-se políticas de exploração de ETRs, após anúncio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e da proposta do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que busca criar a Frente Parlamentar Mista em Defesa das Terras Raras, Minerais Críticos e Estratégicos. Entenda mais sobre a disputa por terras raras.
Reservas, gargalos e oportunidades
Atualmente, a exploração comercial de terras raras no Brasil é concentrada em regiões como Minaçu (GO), mas já foram identificadas jazidas importantes também no Amazonas, em Minas Gerais e na Bacia do Parnaíba — que abrange Maranhão, Piauí e Ceará. Apesar disso, o país atua majoritariamente na extração bruta, exportando os minerais sem processamento. A China, por sua vez, domina cerca de 70% da produção global, graças a décadas de investimentos em tecnologia de refino.
“Para avançar, o Brasil precisará firmar acordos de cooperação científica e tecnológica com países parceiros, além de desenvolver sua logística e infraestrutura”, defende Portela. A agregação de valor ao minério, segundo ele, seria fundamental para transformar o potencial natural em desenvolvimento econômico, empregos qualificados e soberania tecnológica.
Projeto de lei quer barrar exportação de minério in natura
Tramita atualmente no Senado Federal o Projeto de Lei (PL) nº 2197/2025, de autoria do senador Rogério Carvalho (PT-SE), que busca justamente garantir que a exportação de terras raras, ouro, lítio e outros minerais estratégicos só seja permitida após beneficiamento ou processamento no Brasil. O texto exige ainda que 80% do refino aconteça em território nacional. A proposta visa evitar que o país repita erros históricos de vender matéria-prima barata e comprar tecnologia cara.
Além de promover o desenvolvimento da indústria nacional, a medida fortaleceria o poder de barganha do Brasil em negociações com grandes compradores, como os Estados Unidos. “Nada impede que eles tentem condicionar acordos comerciais à compra desses minérios, mas se o Brasil tiver domínio tecnológico e industrial, poderá negociar em condições mais favoráveis”, pontua Portela.