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OPERAÇÃO DROPOUT | Dinheiro desviado da saúde abasteceu campanha eleitoral. “Tenho convicção”, afirma ex-procurador
Uma bomba a nova entrevista do ex-procurador da Saúde da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista, Edmundo Ribeiro Neto. Autor da denúncia que desencadeou a Operação Dropout pela Polícia Federal, o advogado complica bastante a gestão da prefeita Sheila Lemos com as novas revelações apresentadas em entrevista à Mega Rádio. Segundo ele, o dinheiro desviado da saúde teria sido usado na campanha eleitoral do ex-prefeito Herzem Gusmão.
Entre outros detalhes apresentados, o ex-procurador afirma que informações foram subtraídas ao TCM. “O processo de pagamento da compra dos 10.000 testes não foi enviado para o Tribunal de Contas. Essa ‘subtração’ de documentos se deu já na gestão de Sheila. Isso porque a prestação de contas é realizada no mês subsequente ao da realização da liquidação. As pessoas envolvidas na condução do processo de compra fraudada permaneceram trabalhando e em cargos de chefia”.
Ainda segundo Edmundo, o seu afastamento do cargo de procurador da Saúde só pode ser explicado porque a gestão não desejava investigar a fundo a questão. “Bem, qual razão a prefeita teria para tentar abafar esse caso, senão a certeza de que o dinheiro desviado abasteceu sua campanha?”, indaga Edmundo Neto.
Abaixo, a íntegra da entrevista:
Mega: Você poderia nos fornecer mais detalhes sobre o processo de apuração e como chegaram à conclusão de que o processo tinha sido fraudado? O principal indício que você percebeu?
Edmundo: Como foi explicitado pelo delegado (da Polícia Federal), a apuração se iniciou por conta das denúncias do “Blog Sudoeste Digital”. O Prefeito da época, que ainda era Herzem, pediu que fossem auditadas as compras dos testes de Covid. Chamou a minha atenção um processo que iniciou-se para compra de 14.000 testes, quando foram adquiridos apenas 4.000, sendo que em apenas dois dias iniciaram um novo processo de aquisição para os mesmos 10.000 que não foram adquiridos. Analisando esse processo, percebemos que a equipe que estava cotando os valores dos produtos não era a mesma do primeiro processo, nem mesmo era habitual que eles fizessem esse procedimento. Com as cotações desse processo e as cotações do primeiro processo em mãos, foi possível verificar que eles alijaram as melhores propostas para aquisição dos testes com objetivo de direcionar e superfaturar a compra.
Mega: Como foram conduzidas as investigações internas para apurar as irregularidades? Quais foram os principais desafios enfrentados durante esse processo?
Edmundo: O principal desafio era apurar sem chamar atenção dos envolvidos, uma vez que exerciam cargos de chefia. Depois, o principal desafio era prosseguir com as apurações, já que o prefeito que solicitou a auditoria adoeceu e foi hospitalizado (Herzem Gusmão adoeceu por complicações da Covid-19 em 2020 e faleceu em março de 2021). Não tínhamos comunicação. Como era claro, a princípio, o superfaturamento, eu tinha mais tranquilidade para trabalhar, porque imaginava que a gestão, mesmo não sendo Herzem, daria as condições necessárias. Quando surgiu a informação da possibilidade desses recursos desviados terem sido direcionados para campanha eleitoral, aí que ficou mais complicado. Não tinha como provar isso, e sabíamos que a gestão não teria interesse em apurar.
Mega: Você pode compartilhar mais detalhes sobre como surgiu a informação da possível destinação dos recursos desviados para uma campanha eleitoral? Essa campanha seria a de 2020?
Edmundo: Sobre isso eu não posso falar. Tenho apenas convicções. Nada de concreto, ainda.
Mega: Existe alguma razão específica para acreditar que a gestão municipal não teria interesse em investigar essa possibilidade de desvio de recursos para campanha eleitoral?
Edmundo: Vamos lá: o fato de ter sido afastado da Procuradoria da Saúde sem qualquer justificativa foi o primeiro indício de obscuridade na condução dessa situação. O processo de pagamento da compra dos 10.000 testes não foi enviado para o Tribunal de Contas. Essa “subtração” de documentos se deu já na gestão de Sheila. Isso porque a prestação de contas é realizada no mês subsequente ao da realização da liquidação. As pessoas envolvidas na condução do processo de compra fraudada permaneceram trabalhando e em cargos de chefia. Nesse período, Sheila era polo passivo de uma ação eleitoral, onde o candidato Zé Raimundo e o PT denunciavam compra de votos. A secretária de Saúde foi afastada, segundo o diário oficial, a pedido, mas sabemos que foi uma manobra para tentar ludibriar a opinião pública. Nessa mesma época, o processo que tentava a cassação de Sheila já estava concluso, vindo a indeferir o pedido de Zé Raimundo oito dias após o afastamento da secretária. Bem, qual razão a prefeita teria para tentar abafar esse caso, senão a certeza de que o dinheiro desviado abasteceu sua campanha? Esses são elementos fáticos, mas ainda assim conjecturais. Vamos saber exatamente o que aconteceu caso as pessoas envolvidas delatem nos respectivos processos. Minhas convicções eu extraio dos fatos que te relatei. O desvio foi concomitante ao processo eleitoral. Tenho convicção que as pessoas envolvidas não ficaram com esse dinheiro.
Mega: Você pode explicar mais sobre a questão da prestação de contas não ter sido enviada para o Tribunal de Contas? E dar mais detalhes sobre esse processo de cassação?
Edmundo: O município tem obrigação legal de prestar contas das suas despesas. No processo de prestação de contas é encaminhado nota de empenho, nota fiscal, comprovação de entrega dos produtos ou serviços. O pagamento pela compra desses testes se deu no dia 11/12/2020. Teria que ser enviado juntamente com a prestação de contas do mês de dezembro até o dia 31/01/2021, processo pagamento n° 009495/2020. Esse processo consta da lista de pagamentos, onde você pode conferir valor, data, etc. Mas na prestação de contas, do processo 9494 pula para o processo 9496. Ou seja, o processo 9495 foi suprimido. Por conta disso, não pode afirmar sequer que esses testes foram entregues pela empresa. Não tem nota fiscal, não tem canhoto com assinatura do recebedor.
Mega: Existe alguma justificativa ou explicação oficial da administração municipal sobre a ausência do processo de pagamento na prestação de contas?
Edmundo: Não… Até então não.
Mega: Como essa falta de documentação afeta a possibilidade de responsabilizar os envolvidos nas possíveis irregularidades na aquisição dos testes de Covid-19?
Edmundo: Eu imagino que a intenção de subtrair o processo de pagamento seria encobrir duas coisas: a origem dos testes, que saíram inicialmente da empresa de MG (Minas Gerais) ligada à diretora, dificultar o rastreamento dentro da secretaria, já que penso que esses testes sequer foram entregues. Subtraindo o processo com a nota fiscal não se tem acesso aos dados do produto, exemplo do lote e importador.
Mega: Você acha que existe a possibilidade de que outros processos de pagamento ou despesas tenham sido suprimidos ou omitidos da prestação de contas do município?
Edmundo: Tenho certeza que sim. Processos licitatórios inteiros estão sendo suprimidos das prestações de contas. Aí eu já estou dizendo como cidadão que vem acompanhando as prestações de contas, não mais como ex-procurador.
Mega: Você acredita que realmente houve falhas ou inconsistências com esses lotes? Ou essas vacinas podem nem mesmo ter chegado até o município e o argumento de “pedir uma troca do lote” pode ter sido usado como uma forma de despistar o que estava acontecendo naquele momento? (em julho de 2020, a Gestão Municipal alegou que os lotes enviados para o município apresentavam inconsistências e precisavam ser trocados)
Edmundo: Essa troca de lotes foi apenas para trocar a empresa. Essa empresa Comercial Ribeiro pertence a uma parente próxima da diretora afastada. O delegado (da Polícia Federal) chegou a mencionar isso, que houve a suspensão de um contrato. Muitos testes que nunca chegaram aqui não havia controle e foram colocados na conta de um outro escândalo, quando um servidor “emprestava” testes para outros municípios. Esses testes que nunca existiram ficaram na conta desse servidor.
Mega: Você notou algum padrão ou tendência em relação aos tipos de contratos ou fornecedores cujos processos licitatórios estão sendo suprimidos?
Edmundo: Sim, mas são contratos de outras secretarias. Não apenas da Saúde. O que penso ser irrelevante agora, já que estamos tratando apenas das compras da Saúde.
Mega: Como advogado, você poderia me informar quais são os procedimentos formais e regulamentos que regem a inclusão de processos licitatórios nas prestações de contas municipais e como essas supressões violam esses procedimentos?
Edmundo: Os dispositivos legais que determinam aos municípios que prestem contas e de que forma devem fazer são várias. As mais importantes da maior para menor: Artigos 71, inciso VIII, da Constituição da República, 91, inciso XIII, da Constituição Estadual, 68, 71 e 76 da Lei Complementar n 06/91 e 206, § 3º da Resolução n 1.392/2019.
Mega: Hoje você tem certeza que o seu afastamento foi devido às informações que você tinha? Quem você acha que tomou a decisão do afastamento?
Edmundo: Ninguém chegou pra mim e disse isso: “você está sendo afastado por conta das denúncias”. Mesmo porque ninguém falaria isso. Eu me baseio no conjunto fático. Na observação de como as coisas ocorreram. Somente a prefeita tinha poderes para me afastar. Penso que fez isso por solicitação e intervenção de alguém que estivesse muito envolvido nesse processo, exemplo: secretária de Saúde. Mas não posso provar.
Mega: Tem mais alguma informação que você acha necessário pontuar?
Edmundo: Eu acho que não. No mais agora é aguardar o desdobramento dessa operação, que com certeza vai descambar para denúncia do MPF em face desse pessoal. Nos depoimentos eu imagino que virão informações com potencial para chocar a cidade. Isso se não ocorrer uma delação antes de chegarmos no tempo dos depoimentos.
A equipe da Mega Rádio pediu um pronunciamento oficial para a SECOM (Secretaria de Comunicação) da Prefeitura de Vitória da Conquista na última terça (29) mas não obtivemos retorno. Tentamos mais uma vez hoje a tarde e a SECOM apenas confirmou o recebimento do pedido, mas até o momento da publicação. | MegaRadioVCA.