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Ferrovia que vai ligar Atlântico ao Pacífico começa a virar realidade

Fruto de parceria estratégica sino-brasileira, corredor ferroviário deve cruzar o Brasil até o Peru, facilitar exportações e abrir caminho para novos investimentos
O corredor ferroviário que promete unir os oceanos Atlântico e Pacífico está mais próximo de sair do papel. Brasil e China assinaram um acordo para iniciar estudos conjuntos de um projeto que pretende integrar as ferrovias de Integração Oeste-Leste (Fiol), Centro-Oeste (Fico) e a Ferrovia Norte-Sul (FNS) ao recém-inaugurado Porto de Chancay, no Peru.
Pelo traçado previsto, o eixo parte de Ilhéus, na Bahia, passa por Mara Rosa, em Goiás, avança pelo Mato Grosso até chegar a Lucas do Rio Verde, onde começa a Ferrovia Bioceânica. A nova linha cruzará a fronteira com a Bolívia, seguirá por Rondônia e pelo sul do Acre até alcançar o Porto de Chancay — construído por investidores chineses — a apenas 70 quilômetros de Lima, capital peruana.
Parte do corredor já está em execução no Brasil: a Fiol avança nos trechos baiano e goiano, enquanto a Fico está em obras no Mato Grosso. Mara Rosa será o ponto de conexão dessas ferrovias com a FNS, que liga Açailândia, no Maranhão, a Estrela d’Oeste, em São Paulo.

Encontro do BRICS

A assinatura do acordo ocorreu logo após o encerramento da 17ª Cúpula do BRICS, realizada no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7. Durante o encontro, o presidente Lula e o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, tiveram uma reunião bilateral que reforçou a parceria estratégica entre Brasil e China.
Um dos principais temas discutidos foi o avanço de projetos de infraestrutura, como a Ferrovia Bioceânica, considerada peça-chave para ampliar a integração logística entre o Atlântico e o Pacífico.
Na declaração conjunta divulgada no domingo (6), os países do grupo assumiram o compromisso de fortalecer o diálogo para expandir a infraestrutura de transportes entre as nações em desenvolvimento.
“Esperamos promover ainda mais o diálogo sobre transportes para atender às demandas de todas as partes interessadas e aprimorar o potencial de transporte dos países do BRICS, respeitando, ao mesmo tempo, a soberania e a integridade territorial de todos os Estados-membros no âmbito da cooperação em transportes”, destacou o documento.
A nota final também enfatizou que a integração entre diferentes modais de transporte é essencial para impulsionar o desenvolvimento econômico de forma equilibrada e alinhada com a pauta ambiental:
“Reafirmamos nosso compromisso com o desenvolvimento de uma infraestrutura de transporte sustentável e resiliente, reconhecendo seu papel crítico no crescimento econômico, na conectividade e na sustentabilidade ambiental”, diz o texto oficial.
Leia aqui a declaração final da Cúpula dos BRICS
Rotas de Integração ganham força
Essa ligação faz parte das Rotas de Integração Sul-Americana, iniciativa lançada em 2023 pelo governo federal como um dos pilares estratégicos do Novo PAC. O programa foi criado para priorizar obras que fortaleçam a conectividade física entre o Brasil e seus vizinhos, integrando rodovias, hidrovias, ferrovias e portos em regiões de fronteira.
O objetivo é facilitar o escoamento de produtos como grãos, minérios e insumos industriais, reduzindo custos logísticos, diversificando rotas de exportação e aproximando o Centro-Oeste e o Norte do Brasil dos mercados do Pacífico e da Ásia.
Além das ferrovias em construção, essa faixa de integração já conta com uma infraestrutura rodoviária estratégica: no lado brasileiro, destacam-se as BR-364 e BR-317, que cortam o Acre, Rondônia, Mato Grosso e ligam a fronteira com o Peru. Do lado peruano, a estrada Interoceânica Sul (Irsa Sur) completa o corredor, ligando a região de fronteira ao Porto de Chancay e à capital, Lima, fortalecendo a vocação da rota como alternativa logística para a América do Sul.
Memorando assinado em Brasília

O memorando de entendimento foi assinado nesta segunda-feira (7) no Ministério dos Transportes, em Brasília, com presença de autoridades brasileiras e representantes da Embaixada da China. O acordo formaliza o início dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental para o corredor ferroviário bioceânico.
Os trabalhos serão conduzidos pela Infra S.A., estatal vinculada ao ministério, em parceria com o China Railway Economic and Planning Research Institute, braço técnico da China State Railway Group, maior operadora ferroviária do mundo e referência em alta velocidade, logística pesada e integração de modais.
Segundo o governo, o memorando é mais do que um ato simbólico: é o ponto de partida para destravar investimentos, garantir segurança jurídica a parcerias privadas e alinhar o projeto a outras obras prioritárias do Novo PAC.
Parceria estratégica sino-brasileira
Essa articulação ganhou força em abril, quando uma delegação do instituto chinês visitou obras estratégicas como a Fiol 1 e a Fico. A missão reforçou o interesse da China em participar não só do planejamento, mas também da futura operação e possíveis investimentos.
Em maio, durante visita oficial do presidente Lula a Pequim, o projeto foi reafirmado em reuniões com o presidente Xi Jinping como um dos pilares da nova agenda de cooperação estratégica entre os países, que também envolve o Novo PAC, o plano de transformação ecológica e a Nova Indústria Brasil.
O objetivo comum é consolidar o Brasil como hub logístico para escoar produtos rumo ao mercado asiático, aproveitando a experiência chinesa em grandes obras ferroviárias e expansão de malhas em áreas remotas.
Mais exportação e menos custo logístico
A ideia é abrir uma rota de exportação pelo Pacífico para facilitar o transporte de grãos e minérios do Centro-Oeste. Isso deve reduzir custos logísticos, fortalecer o agronegócio e diversificar os caminhos para o comércio exterior.
O eixo Fico-Fiol, que terá leilão previsto para o primeiro semestre de 2026, é o pilar da rota. O projeto também integra rodovias, hidrovias e portos existentes, formando uma malha mais eficiente e sustentável.
China traz experiência em trilhos
A China State Railway Group, parceira nos estudos, é uma gigante global do setor. Só nos quatro primeiros meses de 2025, sua malha transportou mais de 1,46 bilhão de passageiros, um recorde histórico. A empresa também opera a maior rede de trens de alta velocidade do mundo e lidera projetos como a ferrovia Jacarta–Bandung, na Indonésia.
Representando os chineses, o diretor-geral Wang Jie afirmou: “Esta parceria é fruto da confiança mútua e vai trazer benefícios reais para os sistemas de transporte de Brasil e China.”
Próximos passos para tirar o projeto do papel
O secretário nacional de Transporte Ferroviário, Leonardo Ribeiro, celebrou o avanço: “Este memorando é o ponto de partida de uma jornada que vai aproximar continentes, reduzir distâncias e fortalecer laços de longo prazo.”
O secretário especial do PAC, Maurício Muniz, reforçou que os estudos seguem diretrizes definidas pelos presidentes Lula e Xi Jinping. Já a diretora da Infra S.A., Elisabeth Braga, destacou que a estatal está preparada para liderar a parte técnica.
Equipes do Brasil e da China já analisam detalhadamente a logística, o escoamento da produção agrícola e mineral e as rotas bioceânicas na América do Sul. A expectativa é que os estudos viabilizem novos investimentos, concessões ferroviárias e mais eficiência no transporte de cargas.
“O Brasil está preparado para liderar uma nova era de infraestrutura logística, com engenharia de qualidade, parcerias sólidas e trilhos voltados para o futuro”, finalizou Leonardo Ribeiro.
A cerimônia contou também com representantes da Casa Civil, do Ministério do Planejamento e da Embaixada da China.